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8.04.2015

07 O jogo das causas

O conceito de causalidade esta no caminho da medicina tanto no que se refere ao conteúdo como à mensagem transmitida pelos sintomas. Assim como as ciências naturais, ela chegou à conclusão de que tudo tem uma causa que se encontra no passado. Seu objetivo é encontrá-la e eliminá-la. Defensores de outros princípios costumam atacar a medicina acadêmica por não ser científica, uma crítica que se volta contra eles mesmos, como se verá.
O que mais chama a atenção nesse conceito de causalidade é sua limitação. Ele só pode investigar em uma direção, ou seja, no passado, e a pergunta standard, “Por quê?", somente pode ser feita uma ou no máximo duas vezes. Naturalmente se poderia pesquisar em outras direções continuar perguntando tanto quanto se queira. Por que tenho um resfriado? Uma resposta acadêmica aceitável poderia ser: “Porque contrai o agente causador há dois dias". Mas por que contraí o agente causador? - "Por que meu sistema imunológico estava debilitado". Aqui também pode-se continuar perguntando: Por que o sistema imunológico estava debilitado? Em algum momento a resposta se referirá à herança genética, seguindo o refrão: "Porque eu herdei esse sistema de defesa de meus pais". Mas por que meus pais me transmitiram exatamente este equipamento imunológico? A resposta então dirige-se aos avôs, que novamente o herdaram de seus pais, etc. Ao final chega-se a Adão e Eva e à pergunta: "Por que os primeiros seres humanos incorporaram um tal sistema imunológico?" Com a mesma técnica de perguntas, poderíamos chegar "cientificamente" ao Big Bang. De qualquer maneira, a resposta à pergunta seguinte permanece em aberto: Por que - pelo amor de Deus-  houve essa explosão inicial?
O principio de causalidade somente age de maneira tão convincente à primeira vista, mostrando fraquezas evidentes a um olhar mais atento. Sua maior fraqueza é que ele comprovadamente não se ajusta à realidade, como nos demonstra a física moderna. Sendo a ciência natural mais avançada, ela ultrapassou as fronteiras de uma visão de mundo mecanicista baseada no principio da causalidade e o refuta.
Os físicos chegaram a este ponto de transição, decisivo não apenas para a medicina, pesquisando as minúsculas partículas no interior do átomo. Eles descobriram que todas as partículas, até mesmo o fóton de luz, possuem uma imagem em espelho no pólo oposto . Para cada partícula existe portanto uma partícula gêmea, que lhe é exatamente contrária em tudo. O método de experimentação segundo o qual uma das duas partículas gêmeas resultantes é estimulada enquanto a outra é deixada em paz remete a Albert Einstein. O desconcertante é que se comprovou que no momento da mudança de estado da partícula estimulada a outra, não-estimulada, também se modificava, de tal maneira que ambas continuavam em pólos opostos. Mais assombroso ainda é que ambas as modificações ocorriam no mesmo momento, descartando assim qualquer forma de transmissão de informações como explicação.
Finalmente o inglês John Bell pôde provar matematicamente que partículas de uma determinada fonte, chamadas partículas de fase fechada, estão ligadas para sempre, sendo que isso acontece de uma maneira não causal, que não pode ser concebida logicamente. O teorema de Bell dá ainda mais um passo e prova que isto não é válido somente para as minúsculas partículas subatômicas, sendo uma lei geral. Com isso, o princípio da causalidade foi refutado e rebaixado a um modelo de explicação que somente permite uma abordagem aproximada da realidade.
Considerando que, de acordo com a ciência, nosso universo surgiu de uma explosão, o chamado Big Bang, ele necessariamente tem que se constituir de partículas estreitamente ligadas umas às outras. E é exatamente disso que tratam as escrituras sagradas do Oriente. Os Vedas hindus e os Sutras do Budismo descrevem a realidade como estando permanentemente ligada em todos os seus aspectos a todos os seus outros aspectos. Embora hoje em dia os físicos apresentem resultados que parecem igualmente metafísicos, não se trata de uma aproximação do conhecimento moderno ao antigo, tal como se costuma afirmar, mas de uma aproximação unilateral por parte das ciências naturais ao conhecimento atemporal contido nos tratados de sabedoria.
Mas se a causalidade é refutada, permanece a pergunta: por que continuar atendo-se a ela? Não conseguimos viver totalmente sem a causalidade, de qualquer forma não nesta sociedade , porque nosso pensamento está impregnado de causalidade até na linguagem (como demonstra por exemplo esta frase). Entretanto, não há nenhuma razão para aferrar-se a uma forma inferior e limitada de pensamento causal, tal como o sistema cientifico. Na melhor das hipóteses, podemos ampliar a causalidade para utilizá-la como meio de aproximação ao universo que “acontece" sincronicamente, tal como já o fez Aristóteles. A vantagem de sua compreensão mais ampla da causalidade torna-se evidente assim que colocamos cientificamente sob a lupa um fenômeno simples tal como um acontecimento esportivo. Até mesmo a corrida de cem metros rasos ainda é longa demais, e precisamos portanto recortar uma pequena seção, talvez a largada. À pergunta cientifica padrão: qual é a causa para que os esportistas se ponham a correr repentinamente? ha uma resposta cientificamente aceitável: o tiro de largada. Ele atua do passado para o presente, sempre acontece e pode ser reproduzido.
Entretanto, qualquer um que entenda um pouco de atletismo ficará pouco satisfeito com essa explicação. Ele então indicará que a causa real para a partida dos esportistas é seu desejo de ganhar uma medalha de ouro. Mas uma eventual vitória encontra-se ainda no futuro, não sendo portanto aceitável como causa pela ciência. Segundo a concepção de Aristóteles, também existe uma causa-padrão por trás de cada acontecimento. Na corrida de cem metros rasos, seriam as regras do jogo. Estas, por exemplo, proíbem que se use uma bicicleta ou outro meio de auxilio não permitido. Na verdade, os esportistas somente sabem em que direção devem largar graças ao padrão "cem metros rasos", que existe há muito tempo. Finalmente, há ainda a base material ou causas que se encontram nas raias, nos músculos, etc., e que também são aceitas pela ciência. Com quatro causas em vez de uma, ainda não fazemos justiça à realidade, mas estamos mais perto. E se de qualquer maneira não existe causa alguma em última instância, deve-se permitir que se complete uma com três outra;. Caso empreguemos essas quatro causas para a interpretação dos sintomas, aquela apresentada pela medicina acadêmica não se torna errada, sendo somente completada e ampliada.
Devido ao hábito e à cegueira de si mesmo, acontece muitas vezes que a pessoa se refugie nos braços da monocausalidade habitual justamente quando se trata de importantes sintomas próprios. A pneumonia própria é então atribuída unicamente ao agente causador, e a partir daí não se pergunta mais nada. Em cada caso de pneumonia há naturalmente agentes causadores em jogo, eles fornecem a causa que atua a partir do passado. Talvez o fato de que a maioria das pessoas sas abriguem em seus pulmões os agentes correspondentes sem que por isso adoeçam comprove que eles não são os únicos responsáveis. Caso a pessoa seja isolada em uma unidade de terapia intensiva devido, por exemplo, a um grave acidente de carro, os mesmos agentes podem tornar-se subitamente ativos. O perigo de contrair uma pneumonia em uma unidade de terapia intensiva não é tão grande pelo fato de haver tantos agentes, ao contrário, em nenhum outro lugar eles são tão perseguidos e dizimados. A verdadeira razão está no conflito de comunicação que se estabelece assim que todo contato somente ocorre através de tubos de plástico. Assim como sempre se encontra uma causa funcional, sempre surgirá também uma causa de objetivo ou de significado, bem como um padrão em que todo o acontecimento ocorre.